UM EPISÓDIO DE 140 ANOS ATRÁS SE TORNA ATUALÍSSIMO NO “JÚRI SIMULADO” /2011

Aqueles que, nos dias atuais, tanto se assustam com os repetidos ataques de violência contra as mulheres, em nosso País, devem dar um salto no passado e verificar que Mercias e Vanessas já eram barbarizadas nos idos de 1873 – decorrido meio século desde a nossa independência.

O alagoano José Cândido matou Maria da Conceição a punhaladas. Várias. Friamente. Mariquinhas, era conhecida em toda São Luiz, no Maranhão, – como se dizia antigamente – como uma “mulher de vida fácil”. Morena, sensual, vistosa. Os homens não escondiam o desejo em possuí-la. E pagavam para isso. Mas, José Cândido a amava. Desesperadamente. Egoisticamente. Tipo do amor bandido.

José Cândido, vítima de surdez crônica, espalhava entre os amigos “que Mariquinhas era a única mulher que o compreendia”. Doentio, solteirão, aos 60 e poucos anos, José Cândido não queria” dividi-la com ninguém, embora soubesse das limitações impostas pela “airosa profissão da rapariga”. Que poderiam cessar com um casamento, de papel passado, como Mariquinhas tanto sugeria. Mas isso José Cândido repudiava solenemente.

José Cândido deu fim a vida de Mariquinhas ajudado por um aliciado – devidamente remunerado -,” alto e forte”, alcunhado “Piauí”. Chamando a infeliz para a sua casa, José Cândido instruiu o assecla que aprisionasse a morena com um abraço fatal e lhe aplicasse, embebida em um lenço, uma porção de clorofórmio. Desta forma, o cruel assassino poderia – com precisão cirúrgica — consumar sua brutal empreitada. Havia guardado um punhal especialmente reservado para tal fim. O mesmo aconteceria com determinado caixão de defunto, comprado na véspera, em uma funerária, onde havia assegurado que o propósito da aquisição seria para “guardar seus livros em casa…” Mariquinhas ainda foi esquartejada para caber no já mencionado caixão. José Cândido foi descoberto e, sob clamor público, julgado e condenado à prisão perpétua. Seu advogado, Franklin Dória, em brilhante defesa, alegou “insanidade mental” do seu cliente que, desta forma, livrou-se da pena de morte, vigente no país, “herança maldita” do jugo português.

O “Júri Simulado”, na noite de 25 de fevereiro, abordou esse crime hediondo, conhecido como o “caso Pontes Visgueiro”, embate emblemático na esfera do Direito Penal brasileiro, acontecido há quase 140 anos atrás. Com a presença do Desembargador Luiz Tolosa Neto, do Tribunal de Justiça de São Paulo, como Juiz e os advogados Drs. Alberto Zacarias Toron, , na Promotoria e Roberto Tardelli, na Defensoria, uma plateia atenta e interessada, foi envolvida pelo clima com que essas personagens procuram arrebatar a consciência de sete jurados, selecionados entre os acadêmicos recém chegados às Arcadas.

Frases contundentes, tanto do acusador, como do defensor, sob o severo olhar do juiz ecoaram no Salão Nobre das Arcadas. O resultado da sentença repetiu-se e, como em São Luiz, José Cândido foi condenado. Mas a 14 anos e 9 meses de reclusão em regime fechado, pelo assassinato de Maria da Conceição, a cobiçada Mariquinhas.

Protagonistas de uma verdadeira aula de Direito, cuja definição foi dada na frase proferida pelo Diretor da Faculdade, Prof. Titular Dr. Antonio Magalhães Gomes Filho e que tomamos como título destas notas, os causídicos foram demoradamente aplaudidos pela plateia presente.

Antes de encerrar, um detalhe: José Cândido Pontes Visgueiro era um respeitado desembargador, titular de ilibada carreira no Estado de Alagoas. (CRC)