O Dj e o Prof. Goffredo da Silva Telles Jr.

 Conforme noticiou o nosso informativo Folha Dobrada nº 12, ora em circulação, o DJ edita a cada ano uma interessante revista em que relata e avalia o realizado no ano findo, ao mesmo tempo em que realça o trabalho e as dimensões da atuação do Departamento Jurídico do XI, vislumbrando um pouco do que pretendem fazer no presente e futuro próximos.

          A edição da revista do DJ do início de 2004, traz um pouco de tudo isso e alguns interessantes e oportunos depoimentos, como por exemplo de dois grandes mestres, o Professor Dalmo de Abreu Dallari e o Prof. Goffredo da Silva Telles Junior.

          Escolhemos reproduzir o depoimento do Prof. Goffredo, para ficar apenas em um exemplo e subscrever o que foi dito a respeito do DJ. Eis o seu teor:

Lições do mestre: Goffredo da Silva Telles Jr.
Uma conversa com o professor que é um símbolo das Arcadas e da luta por Justiça.

Visitar o professor Goffredo em seu escritório é uma experiência que todos os franciscanos deveriam ter. Antes de Qualquer coisa, como justa homenagem dos alunos a um ensinador devoto e vitalício. O velho pensador recebe as visitas com toda a atenção do mundo, feliz em poder continuar seu ofício mesmo depois de aposentado. Ele é um ser humano admirável. Não é sempre que se encontra uma pessoa de 88 anos apaixonada. Completamente apaixonado. Pela São Francisco, pelo Direito, pelos estudantes… Como descrevê-lo? Penso nele como alguém que deixa comer a sobremesa antes do almoço – uma criatura dócil, embora combatível e combatente.
          Evidentemente, a visita não precisa transformar-se em culto. Não é preciso despojar-se das críticas, concordar com as posições políticas do anfitrião. O que é proibido é deixar de pensar com ele, aproveitar-se de sua vasta cultura e espelhar-se em sua vitalidade intelectual. O homem não pára de pensar, questionar, meditar.
          É impossível sair de lá sem a cabeça inquieta. É como se o pensamento tivesse tomado um ácido, e não conseguisse parar quieto. As lições sobre o direito, a vida, sobre o direito na vida, sobre a vida no direito, ficam pulsando na cabeça e no coração. Visitá-lo é um exercício de reflexão, auto – reflexão. O que é a profissão que abraçamos? Qual é a formação que queremos ter? O que pretendemos fazer com ela?
          Pedimos um depoimento sobre suas impressões do Departamento Jurídico XI de Agosto.
          O professor começou a falar da sua vida, a influência de sua avó, Olívia Guedes Penteado, precursora do movimento modernista e responsável pelo amor especial que Goffredo tem pela arte. Mas por que ele começou a falar de arte? A próxima história começou a esboçar a resposta. Ele contou que freqüentava a casa de Victor Brecheret (nada menos que o autor do Monumento às Bandeiras). Os dois passavam horas conversando no jardim, enquanto o escultor trabalhava numa pedra. Goffredo, ainda bastante jovem, disse ter ficado emocionado ao perceber que surgia, na pedra, um rosto humano. E Brecheret lhe disse: “não se impressione, a figura já esta na pedra, eu só precisei tirar a poeira, soprando com amor”. O futuro jurista guardou aquelas palavras para o resto da vida (basta lembrar que a história foi relatada aos 88 anos). Segundo ele, as leis são nossa pedra, que devemos interpretar para delas extrair o sentido íntimo, o espírito, o rosto humano escondido.
          Esse sentido poético seria o que marca a Faculdade de Direito do Largo São Francisco. “Nossa academia sempre foi de guerra, de luta contra a opressão, da injustiça e a favor daqueles que não têm sequer os meios para acessar a justiça”. Para o Goffredo, o DJ traz em si toda a inspiração que sempre animou a academia, e por isso é uma instituição preciosa dentro da Faculdade. Encarna o sonho que define o Largo. Para o professor, quem não sonha não sabe o que faz na São Francisco.
          A visão dele lembra uma metáfora de um antropólogo francês, Edgar Morin, que dizia, assim como milhares de outros antropólogos, que a passagem fundamental do primata ao homem (da natureza à cultura) foi o domínio do fogo. Para a maioria dos estudiosos, o animal, ao controlar o fogo, pode cozer os alimentos, fixar-se numa região e, de maneira geral, ganhar uma relativa autonomia em relação aos imperativos da natureza, passando então a produzir a cultura. Morin apresenta outra explicação para a constituição do ser humano. Ao dominar o fogo, foi possível afastar o perigo de ataque dos animais, o que permitiu ao primata dormir em paz (não mais em estado de alerta e vigília).

“Nossa academia sempre foi de guerra, de luta contra a opressão, da injustiça e a favor daqueles que não têm sequer os meios para acessar a justiça”.
Para o Professor Goffredo, o DJ traz em si toda a inspiração que sempre animou a academia, e por isso é uma instituição preciosa dentro da Faculdade.

          Com isso, passou a sonhar e, assim, tornou-se homem. É a mesma lição do Goffredo: o homem é um ser essencialmente onírico.
          O sonho marca também a trajetória do estudante de direito. Ele forma-se bacharel, e aprende simplesmente a defender o direito posto, aplicar seus conhecimentos de forma instrumental. O contato com a realidade faz nascer a angústia, por uma justiça melhor do que a existente. Ele passa a querer melhorar a ordem jurídica e também a existência humana. Nasce então o jurista, “com os pés no chão, os olhos na realidade, mas o coração voltado para as estrelas, para os ideais”, segundo as palavras do Goffredo. “Vejo no DJ uma instituição toda voltada para esse sonho da nossa academia. Que papel admirável!”, complementa o professor.
          A idade não prejudicou o primor de lógica que marca as idéias deste pensador. Ora, o primeiro passo da passagem do bacharel para o jurista é a angústia com o existente, que abre a cabeça, desestabiliza, faz crescer e sonhar. Só assim é possível dar o salto de qualidade que diferencia o jurista do bacharel. Ora, o DJ é o refúgio dos angustiados, e o berço de novas angústias. Não é possível permanecer imune ao drama de uma pessoa desempregada, sofrendo despejo, uma mãe com o filho preso injustamente, sem dinheiro para comprar alimentos, para pagar aluguel, uma pessoa despedida sem justa causa e sem receber as verbas a que tem direito. Gente acidentada, louca, explorada. Todos sem orientação jurídica, e mais, sem acesso ao poder judiciário, o que significa às margens do estado de direito. Ou seja, gente angustiada, e que angustia os quase bacharéis, potenciais juristas.
          Trabalhar no DJ é ter a chave na mão para formar-se jurista, muito além de bacharel; pensador, mais do que aplicador; sonhador, antes de conformado. As palavras do Goffredo escancaram uma função essencial do DJ: a formação de juristas. E ele dedica todo o amor que têm à Faculdade ao jurídico, pois enxerga o mesmo espírito de luta e de sonho. De poesia. Arte.
          A visita já dura algum tempo, e o admirável senhor que senta à nossa frente versou das Artes ao Direito, do sonho à justiça. Pensamentos permanentes na mente de um homem que há décadas contamina os estudantes de Direito, em especial os das Arcadas, com sua determinação e amor pelos ideais de justiça, igualdade e democracia.
          E, para encerrar seu depoimento, defende que o Direito deve ser inteiro voltado para o povo, e se vale da poesia, citando versos de Castro Alves que, para Goffredo, “se inscrevem no fundamento do Departamento jurídico da nossa escola”:

“A praça! A praça é do povo
          Como o céu é do Condor.”

Daniel de Campos Antiquera – Diretor de
Assuntos Externos em 2003

          O Dj pode e deve ser apoiado por todos nós, Antigos Alunos. O caminho para tal se encontra em seu site www.djonzedeagosto.org.br clicando no ícone COLABORE.

          Vale a pena dar integral respaldo ao DJ.